quinta-feira, 21 de agosto de 2014

O Encontrar-se

É hora de renascer. Reconstruir-se. Bom senso, vitalidade, força e fé. Fé no que se acredita, fé em si, fé na vida. Não confunda esta fé com religiosidade. Uma coisa não tem nada a ver com a outra. Fé é vida, é espiritualidade, religiosidade é um dogma para o qual a gente escolhe se fechar.

Espiritualidade é encontrar-se, é olhar-se de frente e encarar todos os monstros que pesam sobre os nossos ombros, sobre as nossas emoções, sobre os nossos pensamentos. É não mais enganar-se, ou fingir, acumulando poeira e peso desnecessário. É levantar o tapete sem medo, encarar a poeira e fazer uma limpeza espiritual. É quando nos traz equilíbrio, nos fazendo andar lado a lado ou de mãos dadas com as nossas sombras.

Nossas sombras não são tão más quando as assumimos. Nossas sombras não são tão más quando as compreendemos. Se soubéssemos ouvir o que nós mesmos temos a dizer, seríamos mais leves, resilientes, pacientes. Seríamos menos neuróticos e atormentados. Saberíamos respeitar a si e ao outro. Seríamos mais sábios e mais receptivos à vida. Por que é a vida que clama quando você sente dor.

Durante muito tempo, escolhemos ficar parados e nos acomodamos em uma situação que não aceitamos. Sabemos que aquele não somos nós, que o que mostramos não é nosso Eu verdadeiro. Vivemos uma farsa. Nossos desejos, nossos sonhos, nossas palavras, nossos movimentos, nossos sentimentos, nossos ideais, tudo se apaga quando nos escondemos de nós mesmos. Ficamos sem identidade e nos tornamos àquilo que o outro fala sobre nós.

Não basta deixar o mundo girar, é preciso girar junto com ele. Deixar a loucura de dentro sair, essa loucura que acelera seu coração, mas que só você sabe enxergar e sentir. Essa loucura que se outras pessoas vissem diriam que não é você, mas no fundo você sabe que isso é tão você mesmo, tão fiel a si, um retrato perfeito da sua própria alma.

Precisamos largar a solidão acompanhada, parar de fingir o que pensamos ter e encarar a solidão de fato, encarar a si mesmo. É preciso ouvi-la, senti-la, compreender o que ela tanto tenta nos dizer sobre nós mesmos. Entender seu significado, sua representação, a simbologia que lhe contorna tão cuidadosamente.

A solidão é um espinho que cutuca a alma para fazer sangrar até curar a ferida. É preciso deixá-la falar para que entremos em contato com as obscuridades do nosso Ser e assim possamos utilizar nossa escuridão como força para nos libertarmos. Pois acredite, nossa sombra não é nossa inimiga, mas fazemos dela como tal. Ela é nossa aliada, a mais forte e mais importante para darmos passos livres.

A negação, a raiva, a revolta, a depressão, tudo isso pode nos cegar quando vendamos nossos olhos. Não percebemos que nos aprisionamos as nossas próprias emoções e criações. Aprisionamos-nos dentro do nosso próprio espelho, que nos mostra uma imagem inversa e estranha. Alimentamos a pequena sombra que nos habita, tornando-a um universo com vida própria. Uma vida que te deteriora se você não pará-la a tempo.

Equilibrar-se em uma linha trêmula não é fácil, se fosse, a maioria não se acomodaria. Equilibra-se é uma tarefa difícil e árdua. Mas mais importante do que o caminho que irá trilhar é reconhecer seus próprios monstros, reconhecer como você se coloca no mundo, como se relaciona consigo e com o outro. É a tarefa primordial a se fazer. O primeiro passo a ser dado.

Perceber que a maioria dos monstros são criações suas e mesmo aquilo que é imposto pelo outro, a quem você culpa veementemente como fuga de si mesmo, ainda assim, você tem autonomia para mudar. Você tem autonomia para guiar a sua alma. Basta reconhecer que pode ser uma escolha sua.

Temos autonomia para a mudança. Temos autonomia para escolher se queremos viver com aquilo que nos foi dado ou se queremos desejar, experimentar, fazer, mudar, construir concepções nossas, expandir nosso Ser. Encontrar quem somos de verdade. Encarar a vida e o mundo com leveza. Isto é espiritualidade. É leveza.

Leveza é fazer escolhas sem culpar o mundo, é permitir-se aos seus desejos e sonhos sem culpa ou transtorno. É ter coragem de abandonar os pesos e assumir que estes pesos foram escolhas suas, ainda que o mundo, as pessoas e até você mesmo façam você acreditar que não havia outra escolha ou alternativa.

Leveza é assumir quem você é. De verdade. E não aquilo que você pensa ser. Acredite, existe uma real e grande diferença entre aquilo que você é e aquilo que você acha que é. Sabia ter um olhar simples ao buscar essa diferença. Saiba compreender e aceitar, que lhe pertence e que lhe torna um Ser único no mundo.

Quem você é agora? Em meio a tantos outros que se misturaram a você e que você se deixou misturar. Quais seus gostos? Suas vontades? Quem é você de verdade? Quem é o rosto que se esconde atrás de máscaras e roupas pesadas? Quem é o rosto atrás do espelho?

Você só saberá quando se despir de todos os pesos, mentiras e máscaras, e encontrar-se desnudo de qualquer mediocridade. Quando compreender de fato seus erros e acertos, suas luzes e sombras. Quando alcançar ao menos um pouco de resiliência.

Se você alcançou a sua espiritualidade. Celebre. Você está vivo de verdade.






[Suzanne Leal]

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